Reflexão sobre o homo digitalis

“Tia Tutu, não tem iPad, não tem aguinha. Não tem nada. E agora?”

Amelie nasceu em um mundo de luz azul. Ao 1 ano e 2 meses de idade, pela primeira vez via o apagar. Chovera. Caiu a Luz. O iPad, sem bateria, e não rolava tirar água gelada do filtro.

É de uma geração que veio à luz, e nunca saiu dela. Mal sabia que não muito no passado, vinha-se à luz para adentrar a escuridão. Há 200 mil anos, ao redor do Lago Makgadikgadi, onde hoje é Botsuana, existia outra Amelie. À base da mesma carne e osso, de genética de igual espécie, não conhecia a palavra luz. Sabia do dia, da noite, provavelmente sem nomeá-los. Seguia o fluxo natural do viver.

A luz azul da Amelie do agora seria inspiração espiritual para a Amelie de 200 mil anos atrás. Divina para a Amelie de 10 mil anos atrás. Milagre religioso para a Amelie antes da pipa de Benjamin Franklin. Para a Amelie de agora, é o iPad e a aguinha.

A Amelie do agora segurando o iPad com bateria seria Eos para os gregos. Aurora dos romanos. Citlālicue para os astecas. Yebá Bëló. Jaci segurando Guaraci nas palmas das mãos.

Hoje, Amelie é Amelie. De 1 ano e 2 meses. Ao artificial apagar das luzes em uma chuva de São Paulo, pede para tia Tutu ligar a luz do flash do celular que tem bateria. A Amelie do agora não segue o fluxo natural do viver.

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Crédito da imagem: cena do filme Nós (2019).

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